sexta-feira, fevereiro 08, 2008

DO MASSACHUSETS A PORTUGAL

As eleições americanas transformaram-se no maior espectáculo político do mundo, vendido como tal. Só que desta vez é mais do que espectáculo. É uma verdadeira decisão democrática com implicações no futuro de todos. É verdadeiramente comovente ver como todas as esquerdas europeias, sobretudo as esquerdas “Armani” acompanham com tanto entusiasmo o que se passa no país que passam a vida a abjurar. Até a esquerda, pois, faz a sua directa a ver a CNN para saber os resultados das primárias. Os candidatos suspenderam a campanha para os americanos assistirem à final do Super Bowl, mas isso durou um dia. O espectáculo político vai durar até às eleições propriamente ditas.

Na super terça-feira (nunca percebi as maiúsculas nesta expressão) muito se decidiu. Decidiu-se quem vai ser o candidato republicano e decidiu-se que os democratas ainda não sabem quem querem que seja o seu. Hillary ganhou avanço mas não a vitória. Obama tremeu, mas ainda não perdeu. Vantagem de McCain: a partir de agora pode começar a campanha para a Casa Branca enquanto os seus eventuais adversários ainda terão de discutir nas televisões os clientes mais sinistros dos seus respectivos escritórios de advogados, como já fizeram.

Da terça-feira há dois dados importantes a reter.

O primeiro é este: quem até agora consultasse a comunicação social parecia que os democratas estavam a escolher o futuro Presidente dos EUA. Nada mais existia. A partir de agora parece que vão ter de aturar um maçador candidato republicano que tem fortes hipóteses de ganhar, até porque tem no curriculum uma nítida discordância com Bush e de quem este não esconde que não gosta.

O segundo é este: a vitória de Clinton no Massachusets tem um significado especial. Obama, o candidato chique, simpático, cativante, com voz soul, que tem uma simpática e oportuna avó nos confins do Quénia, escolheu um slogan para a sua campanha que pareceu apropriado ao fim de um ciclo político que termina com uma enorme crise económica nos EUA: “Mudar”. Pois não se sabe bem o quê, para quê, onde, como e com quem, mas também as campanhas não tratam de minudências. Ora, o candidato que promete mudar chegou ao Massachusets e apresentou-se com uma guarda de honra de meter respeito, no Partido, na América e em qualquer parte do mundo: o clã Kennedy, com todo o seu peso clientelar, com toda a sua história quase mítica na política americana, com todo o seu aparelho político familiar. Ou seja: o candidato da mudança apresentou-se com o passado. Com a arqueologia do Partido Democrata, como diria por cá o Primeiro-Ministro que fica aflito com notícias dos anos oitenta. Resultado: perdeu para Clinton.

Este facto transportou-me para a realidade política portuguesa. Não é possível prometer mudar exactamente com os mesmos que foram mudados. É uma lei da vida. Ainda não foi inventada maneira de transformar múmias egípcias em reis do futuro. É por isso que nem PSD nem CDS vão a lado algum no estado em que estão. Aprendam com Obama, por muito que lhes custe. Sob pena de aprenderem à sua custa. Já em 2009. Outra vez.

(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

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