Está na moda considerar que a construção de um aeroporto na Ota é um problema técnico e não um problema político. Será um problema técnico, mas é antes de tudo um problema político. Não é inocente a moda. A intenção é óbvia: se a construção do aeroporto é um problema técnico e não político, então ele deve ser discutido apenas técnicos, os engenheiros. E se assim é, quem decide a sua construção e escolhe o local não é responsabilizável pela decisão que vier a tomar. A moda, numa palavra, convém ao Governo.Lamento, mas não me parece que a decisão de construir o aeroporto e na Ota seja uma mera tecnocracia. Não. Por várias razões.Em primeiro lugar porque ela significa afectar uma gigantesca quantidade de recursos nacionais, que são especialmente parcos, e de forma irreversível. Ainda ontem ficámos a saber que a redução do défice fez-se à custa do aumento das receitas e não da diminuição das despesas. O socialismo no seu pior. O que quer dizer que o Governo falhou na reforma da despesa do Estado. Pelo contrário, descontrolou-a ainda mais. Ora, nestas circunstâncias, é a Ota a solução mais em conta? Não haverá outras mais baratas? Há. Assim se divulguem todos os relatórios sem medo nem deturpação.Em segundo lugar, porque ao decidir afectar esses recursos isso significa que há outras coisas que não vão ser feitas. Não deixa de ser chocante que um país que não tem dinheiro para fazer a manutenção e as reparações nas suas pontes, que a segurança exige (lembram-se de Castelo de Paiva e dos relatórios que a seguir se fizeram sobre o assunto?), se disponha a gastar não se sabe bem quanto numa solução cara e dispendiosa.Em terceiro lugar, porque a escolha do local significa uma opção de desenvolvimento que beneficiará uns e prejudicará outros e deve ser discutida. É um debate político relevante o de saber se, no final, a localização beneficia ou prejudica o país. Se for na Ota, isso significa que mais uma vez o país desiste do Sul e acentua o desequilíbrio regional já visível. Se for em Rio Frio isso significa uma maior diversificação na ocupação do território, com aparentes benefícios do ponto de vista do equilíbrio do todo nacional. Um aeroporto destes é por si só uma nova centralidade. Atrairá economia e população. Ignorá-lo pode ser próprio de técnicos mas é um erro político.Por tudo isto o argumento do problema técnico é um logro. Se me dão licença os polícias da tecnocracia de serviço, eu gostava de ter uma palavra a dizer. Como qualquer cidadão.
(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)
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