sexta-feira, dezembro 01, 2006

O Caso Luísa Mesquita

Com aquela velocidade própria das agendas políticas e mediáticas do nosso tempo, o caso Luísa Mesquita passou rapidamente ao esquecimento. Pelo menos, até ser expulsa do partido, como já sucedeu a tantos antes de chegar a vez desta ortodoxa de ontem, ou até se decidir a sair, como se comprometeu perante o partido, o assunto não mais será falado.

Mas a natureza e o exercício do mandato parlamentar é dos assuntos que vale a pena debater, independentemente das conjunturas picantes, porque é um espelho da qualidade da democracia, diria mesmo, da essência da democracia.

E este é um caso feio, seja qual for o ângulo pelo qual seja analisado.

Pelo lado da deputada, revela falta de palavra, o que não é propriamente um bom cartão de apresentação para um titular de um órgão de soberania. Luísa Mesquita já teve certamente várias oportunidades de criticar José Sócrates por ter violado promessas de campanha eleitoral. Afinal, parece que o mal, não é exclusivo do líder do PS.

Alguém apontou uma pistola à candidata Luísa Mesquita para assinar a papeleta em branco? Alguém fez chantagem com ela? Alguém a coagiu ou obrigou? Que se saiba, não. Ele assinou de livre vontade, assumindo um compromisso. O mesmo compromisso que agora não quer honrar.
Uma pessoa que se candidata a deputada, aceitando colocar nas mãos do partido pelo qual se candidata a sorte do seu mandato, está a dizer ao eleitorado que não passa de um número numa lista de números. Ora, nas eleições é suposto elegermos pessoas e não números.

Pelo lado do Partido, a coisa é ainda mais feia, porque revela que o Partido Comunista continua fiel a si próprio e às ideias anti-democráticas que lhe definem o código genético.

No caso desta conhecida prática do Partido Comunista, mais valia dizer assim: à Assembleia da República candidata-se Sua Excelência o camarada Comité Central, desdobrado em 230 papéis químicos efectivos e mais uns quantos papéis químicos suplentes. Era mais sério. E sem dúvida mais autêntico, porque mais soviético.

O que não é certamente é democrático. Mas isso só atesta uma coerência, sempre foi assim (aliás, até era suposto nunca existir democracia parlamentar de tipo ocidental em Portugal, como garantiu Álvaro Cunha em entrevista a Oriana Fallaci em 1975) e uma força, a força do PC. Como os tempos levam em si os germens do esquecimento, devemos estar agradecidos ao Comité Central o favor de nos lembrar periodicamente a verdadeira natureza anti-democrática desta força de esquerda…

(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

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