segunda-feira, fevereiro 06, 2006

Uma Entrevista A Condizer

Alberto Souto deu uma entrevista paradigmática ao Diário de Aveiro. Está lá tudo o que um bom autarca português deve revelar para se auto-considerar um bom autarca.

O candidato Souto prometeu sete avenidas sete e sete parques de estacionamento sete, nem seis, nem oito, sete. Mas o autarca Souto nenhum fez. Explicação: contingências dos terrenos a expropriar, de terceiros a complicar, do destino a impedir que a promessa resplandecesse. Tudo obstáculos que impediram o autarca de cumprir a palavra do candidato. Mas depois o candidato ataca o autarca: diz que não vale a pena ser pouco sério em campanha. Pronto, está esclarecido, a autocrítica está feita.

O candidato admite críticas dos adversários? Magnânimo, o autarca admite uma: a de que o preço das fotocópias da biblioteca é muito alto. A isto chama-se espírito democrático e mente aberta à crítica alheia. O que querem mais? Por que é que o autarca se recandidata? Por um projecto, por um sonho, por uma competência? Por uma capacidade? Não. Por orgulho. Na obra. Não na obra prometida, que essa, o próprio reconhece e critica, não foi feita. Mas na outra, na que não foi prometida e que, consequentemente, não foi votada pelos eleitores.
Admita-se: todos temos direito à costela de Narciso. Há coisas piores na vida.
Mas o cúmulo patriótico da entrevista é a situação financeira da Câmara. Aqui, o autarca desenvolve uma teoria curiosa. Diz que como a situação do país é má a da Câmara não poderia ser boa. Mais magia. Acaso Pina Moura, Oliveira Martins, Ferreira Leite, Bagão Félix ou Teixeira dos Santos passaram pelo pelouro financeiro da autarquia? Não, senhor autarca. Com a devida licença da sua costela de Narciso a situação financeira é má porque a Câmara foi mal gerida, vive acima do que pode, e ainda por cima deve dinheiro que se farta.

Está bem: formalmente não deve à Águas de Portugal, mas sim à Simria. Mas deve. E já agora, sendo a primeira o accionista principal da segunda, ao dever à segunda, deve indirectamente à primeira. É um mero pormenor capitalista, é certo, mas ainda assim verdadeiro.

Mas o grande contributo que a entrevista de Alberto Souto deu ao debate político foi este: para o autarca quem promete baixar impostos em campanha é demagogo e irresponsável. Foi justamente o que Sócrates, mega-autarca nacional (se considerarmos que Portugal está reduzido a uma quase-autarquia da União Europeia…) e líder do partido em que milita e pelo qual concorre à Câmara fez em 2005.

Conclusão: da forma que isto anda Alberto Souto pode estar descansado. Com toda a certeza deverá ser reeleito.

(publicado na ediçã do Diário de Aveiro de 02.09.2005)

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