sexta-feira, setembro 04, 2009

A EUROPA ESTÁ A MEXER


Entretidos que vamos com as arribas das praias, com o “Exterminador” da Luz e com o desfile de estilos pessoais em que está transformada a pré-campanha para as eleições legislativas e para Primeiro-Ministro de Portugal, nem sequer reparamos que a Europa está a mexer. Não, não me refiro nem às próximas eleições alemãs, em que se joga a sorte de Ângela Merkel, nem ao próximo filme de Carla Bruni, agora surpreendentemente assunto de Estado em França.

Refiro-me à Europa profunda, à Europa de sempre, dos seus conflitos, das suas contradições, das suas memórias ainda por sarar, dos interesses seculares das suas potências, agora em exibição mais nos palcos mediáticos do que nos campos de batalha de outrora.

Esta semana comemoraram-se 70 anos da invasão da Polónia pela Alemanha e do consequente começo da II Guerra Mundial. Parada de estrelas modernas em Danzig, hoje a Gdansk da viragem do Solidariedade dos anos oitenta que começou a minar a ditadura comunista polaca de Jaruzelski, que sucedeu aos acordos de Ialta, de partilha dos territórios europeus pelos vencedores da guerra.

Putin, o preclaro líder russo, pediu desculpa ao mundo pelo pacto germano-soviético de 1939 e anunciou, qual benfeitor, a abertura dos arquivos russos sobre o massacre de Katyn, em que a polícia secreta soviética procedeu a metódica matança de 22 mil oficiais polacos, desde que a Polónia faça o mesmo.

Todas as potências europeias adoptam hoje uma semântica de paz e concórdia baseada na memória da guerra. Mas as tensões de fundo não desapareceram. A Polónia por exemplo desconfia eternamente da Alemanha e da Rússia, disso se ressentindo a União Europeia e a revisão periódica dos seus tratados.

Curiosamente, entretanto, na Rússia de hoje, em que as paradas militares regressaram á Praça Vermelha, Leonid Zhura, advogado de Ievgeni Dzhugashvili, neto de José Estaline, está em tribunal a pedir uma indemnização de 209.000,00 ao jornal Novaya Gazeta, por este ter escrito que o dito Estaline ordenou a matança de civis na então União Soviética. Diz o homenzinho que é necessário reabilitar a memória do sanguinário ditador soviético, que os russos, aliás, continuam a ver mais como líder eficaz do que como aquilo que efectivamente foi.

Como se vê, longe da arribas da costa algarvia e do litoral alentejano, e das eleições de Setembro, a Europa mexe. A Europa mexe sempre, mesmo quando transitoriamente adormecida.

(publicado na edição de hoje do Diário de Aveiro)

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